Queimadas atingem níveis alarmantes na floresta amazônica
Bruno
Taitson (WWF Brasil) -- Juntamente com o fotógrafo Juvenal Pereira,
decolei do Aeroporto de Rio Branco (Acre) em um bimotor Sêneca II, na
tarde do dia 23 de agosto. O objetivo do sobrevôo era fazer fotografias
aéreas da floresta para abastecer o banco de imagens da Rede WWF.
Já
nos primeiros minutos, percebemos que a meta da viagem sofreria uma
alteração. Mal havíamos alçado vôo e já nos deparávamos com diversos
focos de incêndio. Assustador. Uma coisa é ver a floresta queimar em
imagens de televisão ou em fotos. Outra completamente diferente é
presenciar, do alto, chamas consumindo grandes porções de mata nativa,
a ponto de chegarmos a tossir por causa da fumaça e a sentir na pele o
calor das labaredas.
Dados
do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão federal que
monitora por satélite os focos de calor no país, apontam que o número
de queimadas* na Amazônia Legal brasileira, entre janeiro e agosto
deste ano, aumentou cerca de 96% em comparação com o mesmo período de
2006. Nos oito primeiros meses do ano passado, o Inpe detectou 9.119
focos. Este ano, também entre janeiro e agosto, o número saltou para
alarmantes 17.882.
Em
um sobrevôo de apenas cinqüenta minutos próximo à capital Rio Branco,
entre a Rodovia Transacreana e a BR-364, vimos cinco ou seis focos de
incêndio. Também pudemos observar grandes áreas que já haviam sido
devastadas por queimadas recentes.
O
trecho sobrevoado apresentou uma amostragem da ação de dois dos
principais fatores de desmatamento da Amazônia: pecuária e exploração
madeireira. Grandes áreas abertas no meio da floresta eram ocupadas por
rebanhos com dezenas e até centenas de cabeças de gado.
Também
vimos, em vários pontos, toras de madeira empilhadas em clareiras
recentemente abertas, prestes a serem retiradas. O acesso às toras se
dá por pequenas vias de terra abertas no meio da mata, ligando as
clareiras a estradas mais largas que, por sua vez, terminam em rodovias
asfaltadas.
A
situação é ainda mais preocupante pelo fato de a região sobrevoada
estar no entorno de uma capital estadual; uma área, em princípio, mais
fácil de ser fiscalizada por contar com boa infra-estrutura rodoviária
e de telecomunicações. As fotos tiradas durante o percurso revelam a
gravidade da situação, mostrando uma paisagem, na maior parte do tempo,
encoberta pela fumaça e com visibilidade comprometida.
De
acordo com Sidney Rodrigues, coordenador do Laboratório de Ecologia da
Paisagem do WWF-Brasil, o monitoramento das queimadas é de grande
importância para a conservação da Amazônia. “Esses dados servem de
subsídio para a elaboração de uma série de medidas preventivas, como a
criação de brigadas de incêndio em áreas mais críticas, a definição de
calendários de queima e ações de fiscalização e controle”.
O
coordenador destaca também que, especialmente na Amazônia, as queimadas
são utilizadas, principalmente, para preparar o terreno para a formação
de pastagens e por grileiros, que queimam áreas antes de ocupá-las
ilegalmente com objetivo de lucrar com a venda das terras devastadas.
“Por isso, além do monitoramento dos focos de incêndio, também é
essencial criar e implementar unidades de conservação, que representam
um obstáculo a essas atividades ilegais”, conclui.
* na Amazônia, a maior parte dos focos de calor corresponde a queimadas.
Notas complementares**:
O
monitoramento de queimadas e incêndios divulgado pelo Inpe é
viabilizado por meio do satélite meteorológico norte-americano NOAA 15
(National Oceanic and Atmospheric Administration), que fotografa a
Terra duas vezes por dia e orbita a aproximadamente 850 quilômetros de
altitude.
O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) divide as ocorrências de fogo na Amazônia em três categorias:
1
– Queimadas para desmatamento: intencionais e associadas à derrubada e
à queima da floresta. Principal causadora de impactos ambientais, uma
vez que substitui a vegetação florestal por ecossistemas
antropogênicos.
2 – Incêndios florestais rasteiros:
provenientes de queimadas que fogem ao controle e invadem florestas
primárias ou previamente exploradas para madeira. Podem eliminar até
80% da biomassa florestal acima do solo, impactando também a fauna,
além de aumentar a inflamabilidade do solo.
3 – Queimadas
e incêndios em áreas já desmatadas: resultam do fogo intencional ou
acidental em pastagens, lavouras e capoeiras. São responsáveis pela
perda de nutrientes de ecossistemas agrícolas e liberam grandes
quantidades de fumaça e partículas na atmosfera.
As
queimadas e incêndios liberam grandes quantidades de carbono na
atmosfera, agravando o aquecimento global. Também contribuem de forma
significativa para a savanização da Amazônia.
**Fonte:
Nepstad, D.C., A. Moreira e A.A. Alencar. 1999. Floresta em Chamas –
Origens, Impactos e Prevenção do Fogo na Amazônia. Programa Piloto para
a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil. Brasília, Brasil.
(Páginas xii a xvi e página 61)