

Com
frequência, ouço gente atribuindo a origem das queimadas e de fogo nas
encostas a motivos improváveis (quase impossíveis) e até muito
fantasiosos, mas que se propagam na imaginação popular como o fogo se
alastra no mato.
LENDAS:
- Caco de vidro: já ouvi inúmeras vezes que um caco de vidro deixado como lixo no mato, poderia causar a ignição de um incêndio, devido ao efeito do sol através da lente do vidro. Eu não acredito nesta possibilidade! Assim como eu, muita gente, quando criança, brincou de fazer fogo com uma lupa. Utilizávamos uma lupa, que é uma lente perfeita. E o fogo só começava, caso estivéssemos com a lupa diretamente no sol, na altura certa e na angulação correta, para que o foco dos raios de sol atingisse o alvo da forma mais concentrada possível. E isso não bastava. Como o sol movimenta-se no céu, precisávamos ajustar com precisão o ângulo da lupa a cada instante para que o foco se mantivesse no lugar o tempo suficiente para iniciar o fogo. Lembra-se? Portanto, imagine qual seria a probabilidade que um caco de vidro, que dificilmente teria o formato de uma lente (mesmo o fundo da garrafa), lançado aleatoriamente sobre o solo de um local com vegetação pudesse iniciar um incêndio? Amigos, a chance desta hipótese ser verdadeira é praticamente nula!!!
- "Combustão espontânea": muitos cogitam a possibilidade de início de uma queimada a uma situação de excesso de calor combinado com a vegetação muito seca, durante uma longa estiagem. O fenômeno poderia ser potencializado por solos litólicos (rochosos) que acumulariam mais calor. É certo que o potencial de ignição de algumas coberturas vegetais quando secas é muito grande, como no caso do capim-colonião (Panicum maximum), o grande vilão das encostas do Rio de Janeiro. O fogo inicia-se com facilidade e propaga-se com muita velocidade morro acima. Mas, pode-se acreditar que o capim-colonião ou qualquer outra matéria orgância vegetal possa entrar em combustão em condições de campo, com ignição natural causada pelo calor do sol? Com relação a esta possibilidade, lembro-me dos tempos em que era aluno de engenharia florestal na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e, para sanar essa dúvida, nosso professor fez um teste no laboratório. Colocamos uma quantidade de folhas bem secas de capim-colonião em um forno e testamos a que temperatura a combustão se iniciaria. Somente muito tempo, após muito tempo de exposição a uma temperatura muito acima do que seria possível em condições naturais, a matéria vegetal começou a queimar. Portanto, mesmo com muito sol, calor e falta de chuva, a chance de combustão espontânea é muito remota. Faço uma ressalva: já ouvi de especialistas que a combustão espontânea em solo turfoso seria mais provável, mesmo assim em condições muito especiais.
VERDADES:
- Quem causa o fogo é o homem: salvo raríssimas exceções, como vimos acima, atrás de um incêndio florestal, do fogo em pastagens ou nas encostas, haverá sempre a ignorância ou a intenção criminosa de algum ser humano. Focos de incêndio não surgem sozinhos. Os mapas dos locais de maior incidência de queimadas que assolam o país nos meses de inverno em 2010, mostram que estas ocorrem principalmente nas áreas de fronteira agrícola (principalmente nos vetores de expansão de áreas de pastagens sobre a Amazônia e o Cerrado) e nas áreas de pecuária extensiva. Infelizmente, o fogo ainda é uma prática comum para o homem do campo brasileiro.
- Raio: um raio pode começar um incêndio florestal? Essa hipótese sim é muito plausível e é uma das poucas possibilidades aceitáveis de ignição natural. Para que esse risco seja real, as condição de estiagem devem ser muito severas e as condições meteorológicas também seriam muito raras, pois, por sorte, normalmente com as tempestades elétricas seguem-se chuvas, o que minimiza o problema da queimada.
- Capim-colonião: O vegetal, que é exótico (originário da África e que teria chegado ao Brasil no Século XVIII, a bordo dos navios negreiros, onde era utilizado para acolchoar o convés onde ficavam os escravos) é de fato um dos grandes vilões das queimadas nas proximidades do Rio de Janeiro. Trata-se de um agressivo competidor com a vegetação nativa e, como já dissemos, é muito vulnerável ao fogo. O problema é que a sua capacidade de dispersão é também muito grande e o fogo que se alastra sobre a sua folhagem, acaba atingindo a vegetação lenhosa nativa, que uma vez queimada abre espaço para o capim que, oportunistas, ocupa rapidamente aquele espaço, sem permitir que a floresta retorne. Assim pouco a pouco, o capim substitui a floresta. Mesmo após uma queimada, o capim-colonião faz juz ao que o nome científico parece indicar: Panicum maximum (embora não seja essa a origem do nome latino). Chegando a formar folhagens que atingem 2 metros de altura e que apresenta crescimento assustadoramente rápido, a espécie deixa poucas oportunidades para a concorrência (espécies nativas). Quem trabalha com reflorestamento de encostas no Rio de Janeiro e é obrigado a superar as dificuldades impostas pela presença do capim, sabe que ele só tem um inimigo natural: a sombra. Portanto, a forma de vencê-lo é controlar a brotação de suas touceiras com trabalhosas e dispendiosas roçadas periódicas e evitar o fogo com medidas preventivas e implantação de aceiros. A operação precisa ser mantida até que as mudas formem um dossel (copa) capaz de proteger o solo com sombra, pois, só então a vegetação nativa consegue superar a agtressiva competição do capim.
- Balões e a vulnerabilidade das encostas: No Rio de Janeiro e também em algumas outras regiões com serranias costeiras, acontece um fenômeno natural: o regime de ventos, induzido por fatores térmicos do contato costeiro do continente e do oceano, faz com que a brisa marinha (quadrantes Leste e Sul), comum durante o período diurno, irrigue com umidade as faces voltadas para o Sul e Sudeste. De noite, verifa-se em condições normais o vento terral, que sopra do quadrantes Norte e Nordeste. Como é um vento que vem do continente para o mar, é muito mais seco e oferece menos umidade para as encostas Norte. Já notaram que nos morros do Rio de Janeiro exsitem muito mais florestas remanescentes nas faces voltadas para a Zona Sul e que as faces Norte estão quase todas desmatadas? Isso acontece devido à maior vulnerabilidade ao fogo das matas mais secas dessas encostas. O corre que a prática criminosa de soltar balões, por ser proibida e cada vez mais reprimida, ocorre quase sempre nos subúrbios e de madrugada, momento em que seus malfeitores praticantes pretendem não ser descobertos pela ação fiscalizadora. O vento terral da madrugada, justamente lançam os balões contra as encostas mais secas e vulneráveis. Por isso, os balões são considerados umas das principais causas das queimadas na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
- As queimadas provocam mudanças climáticas: o Brasil é considerado um dos maiores responsáveis por emissões de gases de efeito estufa na atualidade. Junto com os países industrializados, e juntamente com a China, Rússia, México e India, somos vistos como um dos maiores vilões das mudanças climáticas que ameaçam o planeta e o futuro da humanidade. E dentre as nossas fontes de poluição que lançam estes gases para a atmosfera, a maior não é a indústria ou o transporte (automóveis), mas as queimadas. Portanto as queimadas são uma ameaça à vida não só dos lugares afetados, mas de todo o planeta.
CONCLUSÃO:
As
queimadas na encosta perto da sua casa e pelo Brasil a fora, como você
vê na televisão, são o resultado da ação criminosa de alguém. As
queimadas destroem as florestas e fazem as encostas ficarem mais
vulneráveis aos deslizamentos que matam tantas pessoas, como aconteceu
em abril de 2010. Encostas sem florestas também causam enchentes. Pense
nisso.
SOLTAR BALÕES É CRIME. FAZER QUEIMADAS TAMBÉM. SEGUNDO O CÓDIGO FLORESTAL PRATICAR ESTES CRIMES EM SITUAÇÃOS DE ESTIAGEM É UM AGRAVANTE E A PENA PODE SER AUMENTADA!!!
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Axel Grael, engenheiro florestal
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