Tentei ficar quieta, na minha. Muitas vezes vi o fogo consumir pastos,
árvores e casas. Na verdade minha relação com o fogo não é lá essas
coisas. Quando criança, morando ao lado de um posto de gasolina, vi os
latões de gasolina pegando fogo, as chamas avançando, minha avó jogando
água com balde, meu tio entre as chamas tampando a boca do tanque
subterrâneo. Naquela época era necessário coar a gasolina para ser
estocada em tanque e isso sempre acarretava acidentes, esse foi um
deles. Como eu disse minha relação com o fogo é algo desastroso, a única
vez que fui internada quando criança foi porque fiquei queimada no
peito e barriga, pensei que a cicatriz da queimadura nunca ia
sair... mas, sumiu, assim como o trauma por causa desse acidente.
Depois, jovem, queimei toda a mão direita. Sem marcas, também. Alguns
anos depois, casada, com os filhos em casa, o botijão de gás pegou fogo,
virou um maçarico, queimando toda minha cozinha, a família foi salva
pelos bombeiros. Assim, com tantas emoções pirotécnicas (prefiro falar
assim...) era para ter me tornado uma pessoa traumatizada por causa
do fogo. O calor das chamas e o barulho do fogo, isso tudo me
impressiona.

Ontem, passeando pelo Sul de
Minas, ia de uma cidade à outra provando as águas medicinais que são
abundantes em São Lourenço, Caxambu e Lambari. Quase chegando ao trevo
que interliga a rodovia Fernão Dias às bonitas cidades de Caxambu e São
Lourenço, o fogo pediu passagem, vi árvores serem devoradas em minutos.

Com
o carro parado à beira da estrada, desci, descalça, com a máquina em
punho fui fotografando a devastação causada pelas línguas
amarelo/alaranjadas que tornavam o verde em preto/pretinho... com
direito à fumaça.

Foi
quando notei uma casa no meio das labaredas... (ou melhor... dentro das
labaredas) não tive medo!... fui até lá. Fotografei. O calor era
insuportável, o barulho era incrível, o estalar da madeira devorada
pelas chamas é como uma sinfonia de Tchaikovsky, fiquei, ali, no meio
das labaredas, sem me importar, sem medo. Alguns carros pararam na pista
para ver o que eu fazia.
Fiquei até o último minuto, até a casa ser consumida e cair diante dos meus olhos.
Voltei correndo ao carro, foi quando
senti o perigo. Veio um senhor e me perguntou de onde eu era... como se
eu não fosse desse mundo. Conversamos rapidamente dissemos adeus e saí
em direção ao povoado ali perto.
Sei que é tempo de queimadas.
Isso é uma tradição secular, vinda da Europa. Estudei esse estranho
costume, tão enraizado na região da Mantiqueira. Só não consigo entender
como, em época de vasta tecnologia, ainda existe, em algumas pessoas,
um grito “neandertal” que as impele a colocar fogo nessas regiões onde a
seca está predominando por causa da estiagem. Só queria
saber dançar sob o som de tambores a dança da chuva... assim,
minha raiz mais tribal faria presença!
Fui conversar com os moradores
locais, alguns acham isso válido, outros querem mesmo botar fogo: “isso é
bom para a terra” – me informaram. Poucos sabem do prejuízo
causado à terra, às plantas, às pessoas e à camada de ozônio.
Costumes... sim, costumes. Punições?! De todas as formas. Existe até
multa, isso doeria no bolso, mas, a polícia tem de
pegar o piromaníaco em flagrante – isso é raro!
Rita Elisa Seda
Cronista, poeta, biógrafa, fotógrafa e jornalista.
8 comentários:
Li, absorvendo cada linha, sentindo toda a revolta e dor que a Mãe Terra deve sentir, ao ser assim agredida.
Como você, não entende nem aceito que "tradições" ponham em risco a vida e a saúde de pessoas, plantas e bens matériais.
Belas e tristes fotos...
Beijo
Muito Lindo!! Nos põe a refletir.... até quando isso vai continuar...
Rita Elisa...
A prática de queimadas rurais tem causado muitos acidentes.
Infelizmente!!!
Aqui na nossa região está terrível, também. Mesmo sendo proibida a prática, alguns produtores insistem em fazer queimadas em suas propriedades, o que agrava a situação. Embora existam leis que prevêem punições para quem for pego ateando fogo, muitos ainda não têm consciência, das conseqüências, dos prejuízos, que as queimadas trazem tanto pra natureza, como para a saúde do próprio homem!
Além de problemas para o meio ambiente, as queimadas registradas no período da seca podem provocar problemas para as pessoas que moram nas regiões atingidas.
Com as previsões climáticas, com aumento da temperatura e queda na umidade relativa do ar, fatores que contribuem para o surgimento e propagação do fogo; todo cuidado é pouco...
A seca na verdade, é o resultado da ação do próprio homem na natureza; pois há muitos anos, este tem utilizado de modo irregular; causando assim desequilíbrios...
Me cortou o coração, ver há dias atrás, a Ilha do Bananal, a maior ilha fluvial do mundo, sendo destruída pelo fogo... Atingindo quase um milhão de hectares. Com a queima da mata, os seres que lá habitam: os animais, as aves, reservas indígenas, as plantas, enfim...
Vidas sendo destruídas em questão de segundos,minutos...
Quanta imprudência! Quanta ganância, meu Deus!!!
Ahhhhhhhhh...seu blog estava “estranho” sem novas postagens...rsrsrsrsrsrs
Estava com saudades!!!
Beijos, forte e carinhoso abraço!!!
Silvinha
Flora querida, eu estou triste por causa da devastação que presenciei não só no Sul de Minas, mas no estado de São Paulo e Goiás. Você conhece bem a região que me referi nesse texto, lute para que ela continue tendo as áreas verdes que são maravilhosas. Vou colocar no blog os encantos desse lugar. Beijos, felicidades e a paz!
Querido Ricardo... até quando isso vai continuar?!! é uma pergunta que há décadas algumas pessoas fazem, ou melhor, muitas pessoas fazem, mas enquanto houver uma só pessoa que possa jogar um palito de fósforo aceso, ou bituca de cigarro em região onde o pasto e árvores estão secas, pronto... nada vale! Hoje, ao passar pelo local do incêndio os bombeiros estavam fazendo relatório e alertando os moradores.
Felicidades e a paz!
Silvinha querida amiga, você tem toda razão!... há vários fatores inerentes às queimadas. Alguns podemos controlar, outros não! Falar, publicar textos, tudo isso vale, mas é pouco. Ontem li em uma exposição ambiental, em São Lourenço uma frase que me marcou: PALAVRAS NÂO RECICLAM LIXO! - uma verdade vinda da sapiência de uma criança. AS palavras podem alertar, mas só lidas ou só escritas, não valem nada... como no caso do alerta às queimadas. Beijos, felicidades e a paz!
Olá Rita,
Descobri o seu cantinho por aqui através de outro blog. Gostei. Sua jornada com o fogo é impressionante. Que sorte a sua ! Ou será que o fogo, apesar das travessuras, é seu amigo?
O fogo produz um fascínio hipnotizante. Mas as queimadas...
Quando vejo queimadas, me lembro de como a humanidade é superficial e imediatista em seus desejos.
Parabéns pelo blog e, se quiser, faça uma visitinha ao meu espaço.
Oi Malu, seja benvinda! Eu não sei dizer se essas tais 'travessuras' do fogo para comigo são assim, digamos, amigas... só posso dizer que estou inteira e sem marcas no corpo e na alma. Isso já é um bom sinal, né?! Vou lá no seu blog dar uma olhadinha, sim. Tudo de bom para você, felicidades e a paz!
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