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Impactos do fogo na vegetação do Planalto do Itatiaia Documento completo - clique aqui De acordo com Ab’Sáber (2005), a paisagem é a herança de processos fisiográficos e biológicos, e patrimônio coletivo dos povos que historicamente as herdaram como território de atuação de suas comunidades. Ou seja, todos nós herdamos o
Planalto de Itatiaia, que de acordo com Santos (2003), corresponde a
14% do Parque. Cabe a nós não passarmos a diante determinados processos
que podem empobrecer a herança atual e a que deixaremos para as
gerações futuras. O fogo não pode continuar a ser o fator mitigador de
perturbações ecológicas que afetam a biodiversidade dos campos de
altitude. Contudo, trata-se de um processo de atuação antiga,
remodelado e modificado por processos de atuação recente. Diferentemente do incêndio de julho de 2001, que consumiu cerca de 600 ha da vegetação campestre nativa em área próxima as Prateleiras, o atual incêndio queimou cerca de 1000 ha, atingindo áreas como a da Pedra do Altar e das Agulhas Negras. Em um levantamento da vegetação existente em 0,08 ha de superfície rochosa, Ribeiro et al. (2001) encontraram 114 espécies (só de plantas), que representa 25% do total de espécies do Planalto (Martinelli e Vaz 1998). Qual a diversidade vegetal perdida neste incêndio? O pouco que sabemos é que um trecho de vegetação existente sobre parte do maciço das Agulhas foi atingido, e de acordo com pesquisas antigas (Brade 1956) e recentes (Condak 2006), a área tem relevante importância biológica, por abrigar espécies sensíveis e ameaçadas de plantas, como Pteridofitas (Figura 1) e uma Cactaceae, Schlumbergera microsphaerica (Figura 2) de ocorrência restrita as Agulhas Negras e ao Pico da Bandeira na Serra do Caparaó - ES/MG. Durante o percurso, foi constatado que muitas plantas estão regenerando e até florescendo, principalmente gramíneas, cyperaceas e compostas. Segundo Brade (1956) muitas destas parecem ter a floração induzida pelo fogo, como a Cortaderia modesta (Gramíneae) e Cladium ensifolium (Cyperaceae). O Bambu Chusquea pinifolia (“bengalinha”) também esta rebrotando, mas não florescendo. Estas espécies conseguem resistir ou tolerar os impactos causados pelo fogo, apresentando rápida regeneração em forma de touceiras (Figura 3) e avançando sobre o espaço antes utilizado por espécies mais frágeis, passando então a serem dominantes numa paisagem menos sortida de espécies. De acordo com a Brade (1956) a dominância destas espécies parece estar relacionada aos incêndios na região constantes durante todo o século XX. Safford (2001) registrou que em áreas queimadas dos campos de altitude da Serra dos Órgãos e do Caparaó, o componente da vegetação que mais rapidamente se regenera é o estrato herbáceo, grande parte deste corresponde a plantas graminóides, mesmo assim o retorno da cobertura vegetal anterior é bastante lento. Outras espécies que apresentam a forma de vida conhecida como roseta, muitas vezes com meristema apical (tecido de crescimento) protegido entre densas folhas basais como Actinocephalus polyanthus (Eriocaulaceae) e Eryngium sp. (Apiaceae) resistiram bem ao fogo (Figura 4). Alguns indivíduos de A. polyanthus apresentaram pronunciado crescimento vertical. Algumas Ericáceas foram encontradas floridas assim como outras espécies menores de Eriocaulaceaes. Muitos Lírios, Hippeastrum sp. (Amaryllidaceae) foram encontrados florescendo. Muitas plantas lenhosas regeneram a partir das raízes, entre estas estão membros das famílias Ericaceae, Asteraceae e Scrophulariaceae (Safford 1999 a, b). Geofitas (bulbosas, pseudo-bulbosas ou cormosas), que incluem membros das Amaryllidaceae (Fígura 5), Orchidaceae, Xiridaceae e Oxalidaceae, paracem apresentar floração em resposta do fogo (Safford 2001). Por
outro lado, algumas espécies raras de Pteridophyta, como Eriosorus
chaeilanthoides, Jamensonia brasiliensis e um raro híbrido entre as
duas espécies, ainda não apresentaram sinais de rebrota (Figura 6).
Jamensonia brasiliensis representa o único caso da distribuição deste
gênero fora dos Andes. Por muito tempo foi considerada endêmica para o
Planalto, até que foi localizada em coleções provenientes dos Andes.
Além disso, algumas espécies arbustivas, das famílias Composta
(Asteraceae), Melastomataceae, Proteaceae e Cunoniaceae, apresentavam
folhas e troncos queimados dando impressão de não resistirem ao efeito
negativo do fogo (Figura 7). O fogo por si só não tem efeito seletivo sobre onde vai atuar e o que vai utilizar como combustível. Espécies raras e ameaçadas, que não apresentam tolerância a este processo, são queimadas, caso não estejam abrigadas em locais que o fogo não tenha como chegar. O resultado disto é que as plantas mais sensíveis vão ficando cada vez mais confinadas aos locais de difícil acesso. Mesmo assim, com auxílio do vento, o fogo pode “saltar” sobre pedras e estradas por exemplo, e atingir novas áreas ainda não queimadas, como as ilhas de vegetação. O impacto do fogo sobre estas ilhas, parece ser ainda mais dramático, visto que entre as poucas espécies que as compõem, muitas são endêmicas. O restabelecimento desta condição singular não parece ser simples. Em geral, espécies que ocorrem sobre a rocha (rupícolas) têm crescimento extremamente lento e segundo Alves (1994), algumas podem levar algo em torno de 150 anos para crescer 50 centímetros de altura. Mesmo as ilhas de vegetação, aparentemente isoladas sobre grandes blocos de pedra, não escaparam da ação do fogo. Briofitas, líquens e outras espécies presentes em algumas ilhas, como a bromélia fernseea itatiae endêmica dos campos de Itatiaia e Serra Fina, foram queimadas. Curiosamente, mesmo queimadas, algumas bromélias foram encontradas em plena floração (Figura 8). Não podemos a priori dizer que sua floração foi induzida pelo fogo, já que esta espécie floresce o ano todo (Ribeiro 2002a). Contudo F. itatiae parece ser resistente ao fogo. De acordo com Ribeiro (2002b), nas poucas ilhas realmente queimadas foram observadas grandes mudanças em composição de espécies. Houve entrada de espécies ruderais típicas de ambientes temperados e o desaparecimento de espécies sensíveis, como as samambaias Doryopteris itatiaiensis e D. feei, de distribuição bastante restrita. A recorrência
do fogo é prejudicial por vários motivos, um dos mais críticos é o do
desaparecimento gradual das populações de espécies raras e endêmicas,
que poderiam servir como matrizes genéticas para a recolonizarão de
áreas afetadas. A extinção de espécies endêmicas corresponde à perda de
diversidade a nível mundial. Martinelli et al. (1989) estimou que 11%
das espécies vasculares do Planalto são localmente endêmicas e 21% são
endêmicas dos Campos de Altitude sob as montanhas do sudeste
brasileiro. Para muitas destas espécies, conhecemos pouco e para
algumas destas o prazer em conhecer pode não ser mais possível. Um
exemplo, desta situação é o caso da Hindsia glabra, espécie com poucos
indivíduos e teoricamente restrita a uma única localidade (sudeste do
Maciço das Prateleiras). Pouco se sabe desta bela espécie de Rubiaceae,
endêmica do Itatiaia e presente na lista de espécies ameaçadas de
extinção. O fogo também pode ter efeitos que aparentemente seriam vantajosos aos campos de altitude, como a ampliação de áreas de campos, a partir da queima de vegetação das matas de neblina ou alto montanas, confinando cada vez mais estas a pequenos fragmentos em meio à paisagem campestre, que não estão confinados a depressões ou agrupamentos de pedras, como ocorre na região das Prateleiras e das Agulhas Negras (Ribeiro 2001a). Esses capões têm árvores testemunhos, que podem chegar a ca. de 7 metros de altura, indicando o porte da vegetação que havia e que continua a desaparecer a cada queimada (Figura 10). Um dos exemplos é o fragmento de vegetação que existe ao norte das Agulhas. De fato em diversos ecossistemas o fogo promove a expansão da vegetação campestre em detrimento da vegetação lenhosa (Bond & Wilgen 1996). De acordo com relatório técnico realizado por Ribeiro (2002b), ficou claro que a queima da vegetação modifica a composição das comunidades de plantas, causando impactos drásticos até em áreas não diretamente afetadas. O fogo traz modificações que nem sempre podem ser enquadradas nas categorias “positivas”/”negativas”, pois quase nunca temos condições para prever como as espécies responderão as perturbações a longo prazo. No entanto pode-se dizer, sem perigo de errar que a freqüência de incêndios no Itatiaia nos últimos 100 anos é excessiva se quisermos a preservação da flora que lá se encontra atualmente. (Ribeiro 2002b). Portanto o fogo não é bem vindo em UCs, cujo objetivo é a conservação dos recursos naturais e genéticos, além do manejo de uso, preservação e manutenção da diversidade natural, dos recursos hídricos, utilizando estes de forma sustentável para manter e resguardar o potencial natural do ecossistema, garantindo a sobrevivência dos seres vivos em geral. De acordo com Santiago, outra conseqüência grave do fogo foi à queima da vegetação ribeirinha junto a nascente do córrego das Agulhas Negras, que junto com o Ribeirão das Flores, contribuem para formar o Rio Campo Belo, um dos principais rios do Parque. A queima de material lenhoso, causando a perda e desvalorização da madeira, o empobrecimento do solo reduzindo a permeabilidade, podendo reduzir ou extinguir mananciais e nascentes, são algumas das conseqüências que a queimada pode desencadear (Couto & Candido 1995). Teixeira (2006), traçou o perfil de todos os incêndios ocorridos no Parque e entorno, a partir de informações arquivadas. Ela identificou que os meses com maior número de ocorrência de incêndio, foram respectivamente, agosto, setembro, julho e outubro. Mais do que fiscalizar é fundamental uma atitude pro-ativa do IBAMA, como a de criação de um programa de trabalho de educação e conscientização ambiental com moradores do Parque e de seu entorno, principalmente nos períodos mais críticos ao fogo, sensibilizando da importância da preservação e dos malefícios que o fogo pode trazer aos recursos naturais existentes na UC e do qual muitos dependem. Um bom exemplo é a redução da visitação de turistas e montanhistas, respectivamente em 80% e 50% quando comparados com o mesmo período de anos anteriores (Santiago, Ralf Salguerio e Célia Gutt). Para a reabertura da trilha das Agulhas Negras, deve ser feita uma melhor sinalização da trilha principal e o fechamento de atalhos. Os Guias devem se comprometer a evitar atalhos, a fim de garantir a recuperação e o restabelecimento da vegetação destas áreas. Muito importante também é evitar o pisoteio de ilhas de vegetação queimadas na base das Agulhas, no caminho da via do Pontão e também no acesso da via de escalada formigueiro. O pisoteamento é prejudicial na medida que compacta o solo e destrói pequenas plantas que estão regenerando. Estudos
de acompanhamento da regeneração das áreas afetadas e de identificação,
mapeamento e monitoramento de áreas com elevado grau de diversidade
vegetal e com espécies endêmicas, devem ser considerados prioridades
para garantir a proteção efetiva deste ambiente. Posteriormente,
estudos a cerca da ecologia, da reprodução e da restauração da
vegetação de campos e afloramentos rochosos, afetados ou não pelo fogo,
serão de extrema relevância para subsidiar a renovação do Plano de
Manejo da UC, com o fim de preservar para futuras gerações este rico,
raro e colorido ambiente que o fogo insiste em queimar. Caso contrário,
a herança que deixaremos para as gerações futuras, estará apenas
preservada nos confins de armários frios e escuros dos herbários.
RELATÓRIO: AVALIAÇÃO DE HIDROCARBONETOS POLICÍCLICOS AROMÁTICOS (HPAs) EM SOLOS QUEIMADOS NA PARTE ALTA DO PARNA DE ITATIAIA. RESPONSÁVEL: Rodrigo Ornellas Meire, MSc. Documento completo - clique aqui Laboratório de Radioisótopos Eduardo Penna Franca, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Prédio do Centro de Ciências e Saúde – Bloco G, Sala 62 - Subsolo. Av. Carlos Chagas Filho. Ilha do Fundão, Cidade Universitária, CEP: 21941-902 – Rio de Janeiro, Brasil. email: romeire@biof.ufrj.br
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